2 de dez. de 2020

Termine o que você começou

E qualquer que não levar a sua cruz, e não vier após mim, não pode ser meu discípulo.

Pois qual de vós, querendo edificar uma torre, não se assenta primeiro a fazer as contas dos gastos, para ver se tem com que a acabar?

Para que não aconteça que, depois de haver posto os alicerces, e não a podendo acabar, todos os que a virem comecem a escarnecer dele,
Dizendo: Este homem começou a edificar e não pôde acabar.

Ou qual é o rei que, indo à guerra a pelejar contra outro rei, não se assenta primeiro a tomar conselho sobre se com dez mil pode sair ao encontro do que vem contra ele com vinte mil?

De outra maneira, estando o outro ainda longe, manda embaixadores, e pede condições de paz.
Assim, pois, qualquer de vós, que não renuncia a tudo quanto tem, não pode ser meu discípulo.

Bom é o sal; mas, se o sal degenerar, com que se há de salgar?
Nem presta para a terra, nem para o monturo; lançam-no fora. Quem tem ouvidos para ouvir, ouça.
Lucas 14:27-35

Reflexão

Nessa passagem do Evangélio de Lucas, Jesus dá como cabeçalho da mensagem um aviso, quem quiser seguí-lo, que esteja ciente que há uma cruz a ser carregada por cada um. Se assim não for feito, essa pessoa não será digna de ser seu discípulo. 

Ele estabelece uma condição sine qua non ao que se propõe a seguí-lo: que carregue a sua própria cruz. 

Diante dessa condição estabelecida, o Senhor Jesus reflete, através de duas ilustrações do cotidiano da época, sobre a vergonha de se iniciar uma tarefa importante e não se terminar o que foi proposto fazer. 

A primeira reflexão é sobre a vergonha de alguém que se propôs a construir uma torre e não pode terminá-la diante dos que passam pela rua e observam a obra inacabada. A vergonha dessa pessoa diante de críticas: "Este homem começou a edificar e não pôde acabar". Lucas 14:30 

A segunda reflexão feita pelo Mestre trata de um rei que num contexto de guerra com um outro rei inimigo que vem lutar com o dobro de soldados. O fato de o rei inimigo ter o dobro de soldados dá a entender que Jesus queria passar a ideia de uma tarefa difícil. Para saber suas chances de vitória, o rei deveria tomar conselho. Caso a resposta fosse positiva, então iria à guerra, caso não tivesse chances, mandaria embaixadores para pedir condições de paz. 

A conclusão da reflexão desses dois exemplos se dá com as seguintes frases: 
1. "Assim, pois, qualquer de vós, que não renuncia a tudo quanto tem, não pode ser meu discípulo". 
2. "Bom é o sal; mas, se o sal degenerar, com que se há de salgar? Nem presta para a terra, nem para o monturo; lançam-no fora".
3. "Quem tem ouvidos para ouvir, ouça".

As comparações parecem ser assim:  

1. Se propor a seguir Jesus = iniciar a construção de uma torre = iniciar uma guerra difícil. 

2. Tomar a sua própria cruz = terminar a torre = guerrear uma luta difícil = renunciar a tudo o quanto tem = o salgado do sal. 

Aqui, nota-se claramente que a principal condição para se seguir Jesus é renunciar a tudo o quanto se tem. 

Nenhuma barreira ou entrave que estejam no caminho do Senhor Jesus deveriam ser tolerados pelo seu discípulo. Há que se abrir mão de qualquer coisa que atrapalhe essa tarefa. 

Jesus estabelece assim uma hierarquia de prioridades na vida de qualquer seguidor seu, na qual o primeiro lugar pertence a Ele, às Suas ordens, Seus comandos, Sua direção, Sua vontade. 

O uso das comparações por Jesus com o cotidiano de seus discípulo não é somente para que eles entendam a mensagem, mas há a transmissão de que a tarefa de seguí-lo é tão importante quanto se fazer uma torre. A torre serve para que um vigia em posição alta e privilegiada, possa notar qualquer inimigo que se aproxima. 
O contexto de guerra já aparece na primeira comparação. 

Em uma guerra, um rei sem torre terminada está sem vigilância. O que traduz imprevisibilidade de um ataque surpresa pelo inimigo, e, por fim, a derrota.  

Ao querer seguir Jesus, a discípulo está iniciando uma guerra. Uma guerra contra si mesmo, contra suas próprias vontades e desejos. O proponente discípulo deve pensar, analisar e tomar uma decisão dentro de si mesmo antes de iniciar seu caminho com o Mestre:  

Se há disposição para abrir mão de tudo o que se tem ou se poderia ter por Jesus. Ou seja, se Jesus ocupa o primeiro lugar em sua vida. Se a pessoa está disposta a renunciar bens, como o jovem rico não fez. Se a pessoa está disposta a renunciar o dinheiro, como Ananias e Safira não fizeram. Se a pessoa está disposta a renunciar os desejos da esposa, quando estes não contra as ordens de Jesus, como o rei Acabe não fez. Se a pessoa está disposta a renunciar seus parentes e sua terra natal, como Abrão fez. 

O que se torna seu discípulo e desiste no meio da caminhada receberá críticas e morrerá. Pois uma guerra é questão de vida ou morte. Ou se mata ou se é morto. Quem não mata suas vontades morre em suas vontades. Quem não mata seus desejos morre imerso neles. 

O desejo de Jesus é que todos sejam candidatos a lutarem nesta guerra e que terminem vitoriosos. Para isso, a mensagem dada é: Termine o que você começou! Renuncie a si mesmo!

No mesmo assunto, o apóstolo Paulo orienta a Timóteo: 

Ninguém que milita se embaraça com negócios desta vida, a fim de agradar àquele que o alistou para a guerra.
E, se alguém também milita, não é coroado se não militar legitimamente.
2 Timóteo 2:4,5

O aviso de Paulo ao seu discípulo Timóteo é sobre a necessidade da renúncia de si mesmo na caminhada com Jesus, e, para isso ele também usa o contexto da guerra, numa situação em que o soldado precisa evitar se embaraçar nos negócios desta vida. Como? Renunciando suas vontades, seus desejos. 
A consequência da desobediência é fatal, o soldado que se envolve com os negócios desta vida não milita legitimamente e não é coroado. O que equivale à derrota, já que coroa na Bíblia simboliza a salvação.

A ordem do Senhor Jesus sobre terminar o que se começou pode ser aplicada a duas situações que estão descritas em três versos de Provérbios de Salomão:

Antes da ruína eleva-se o coração do homem; e adiante da honra vai a humildade.
Provérbios 18:12

Não dês às mulheres a tua força, nem os teus caminhos às que destroem os reis.

As mãos diligentes governarão, mas os preguiçosos acabarão escravos.
Provérbios 12:24

O orgulho, a cobiça dos olhos e a preguiça são ameaças constantes ao homem. Mesmo para aquele que decidiu seguir Jesus, estes três pecados, em especial, terão que ser vencidos diariamente. Caso o discípulo de Jesus baixe a guarda, ele pode, repentinamente, se encontrar numa situação de derrota, de morte.  

Como a cidade derrubada, sem muro, assim é o homem que não pode conter o seu espírito.
Provérbios 25:28

Assim Salomão descreve tal homem que não sabe se controlar, como uma cidade derrubada, sem muro, vulnerável aos ataques inimigos. 

Qual é o segredo? Existe um lugar para se esconder dos desejos humanos? Ou pode-se atingir um auge espiritual no qual o orgulho, a cobiça dos olhos e a preguiça possam não ser ameaça? 
Perceba que nem mesmo Satanás, enquanto querubim, esteve imune aos seus próprios desejos.
Como vencer então? O apóstolo Paulo nos ensina em sua Carta aos Filipenses: 

Mas o que para mim era lucro passei a considerá-lo como perda por amor de Cristo;
sim, na verdade, tenho também como perda todas as coisas pela excelência do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor; 
pelo qual sofri a perda de todas estas coisas, e as considero como refugo, para que possa ganhar a Cristo,e seja achado nele, não tendo como minha justiça a que vem da lei, mas a que vem pela fé em Cristo, a saber, a justiça que vem de Deus pela fé;
para conhecê-lo, e o poder da sua ressurreição e a e a participação dos seus sofrimentos, conformando-me a ele na sua morte, para ver se de algum modo posso chegar à ressurreição dentre os mortos.

Não que já a tenha alcançado, ou que seja perfeito; mas vou prosseguindo, para ver se poderei alcançar aquilo para o que fui também alcançado por Cristo Jesus.

Irmãos, quanto a mim, não julgo que o haja alcançado; mas uma coisa faço, e é que, esquecendo-me das coisas que atrás ficam, e avançando para as que estão adiante,
prossigo para o alvo pelo prêmio da vocação celestial de Deus em Cristo Jesus.
Filipenses 3:7-14

Ele abandona o que, para ele, como homem carnal, seria lucro e prossegue para alcançar a salvação, o que lhe dará lucro, sobre a perspectiva do homem espiritual.
Quando o apóstolo diz que esquece-se das coisas que ficam para trás, não está orientando ao leitor para se esquecer todas as coisas que aconteceram e deixar de resolver situações antigas que exigem solução, inclusive, antes de se ofertar. Se há necessidade, deve-se pedir perdão a Deus ao próximo, há que se lembrar das próprias fraquezas para que se tenha prudência. A orientação de Paulo quando diz que ele mesmo se esquece das coisas que ficam para trás é que o discípulo de Jesus deve esquecer dos prazeres que abandonou por Jesus, não se lamentar sobre o que foi abandonado por Jesus, mas esquecer as coisas do mundo e avançar para o alvo, a coroa.    

Se o discípulo de Jesus pensa estar num alto patamar espiritual, totalmente imune às ameaças que já derrubaram tantos, e abandona a luta contra si mesmo, há um aviso na Bíblia:

Você conhece alguém que se julga sábio? Há mais esperança para o insensato do que para ele.
Provérbios 26:12